terça-feira, 30 de março de 2010

Ao mestre, com carinho

Muita gente torce o nariz quando o assunto é jornalismo esportivo. Crônica esportiva, então, é algo que passa longe da biblioteca de quase todos os meus amigos. Mas devo confessar que tenho esporte no sangue. Sou boleira, ex-nadadora, judoca, ciclista de fim de semana e palpiteira de plantão. E é claro que, por conta disso, segunda-feira o meu dia foi bem mais triste, após saber da morte de Armando Nogueira.

Pra quem não conhece, Nogueira foi um dos maiores cronistas esportivos que o Brasil já teve. Acho que só fica atrás de Nelson Rodrigues. Um craque com as palavras, um gênio com as ideias; dono de frases sensacionais, do tipo "Deus é esférico", numa referência à bola de futebol; "No futebol, matar a bola é um ato de amor. Se a bola não quica, mau-caráter indica", ou ainda "Herois são reféns da glória. Vivem sufocados pela tirania da alta performance". Botafoguense fanático, "seu" Armando defendia a ideia de que cronista esportivo não devia se isentar de ter um time do coração. Mais do que isso, Nogueira era um poeta do futebol. Dificilmente alguém que acompanhava suas crônicas saía imune de se apaixonar pelo esporte bretão em questão de segundos. E foi assim comigo.

Como se fosse hoje, lembro-me das manhãs de domingo em que eu saía - de bicicleta, ou várias vezes a pé - para comprar o jornal na banca do centro. Nem esperava chegar em casa; começava a devorar as palavras do mestre ali na rua mesmo, o que já me causou situações embaraçosas. Como o dia em que bati com a cabeça no orelhão, distraída que estava com a leitura de uma de suas crônicas. As poucas pessoas que estavam na rua àquela hora não deixaram de reparar na adolescente retardada e atordoada com o pancadão que havia levado. Como se não houvesse ninguém ali, levantei do chão, recolhi o jornal e retornei à leitura. Claro que a dor de cabeça me perseguiu por vários dias.

Foi por meio das palavras mágicas de Armando Nogueira que eu comecei a pensar em, quem sabe um dia, escrever tal como ele. Foi ele quem incendiou ainda mais a minha paixão pelo esporte. E é ele que faz minha semana ser muito mais triste. Não o conheci pessoalmente. Mas sua partida me deixou profundamente abalada, como se perdesse um ente querido. Nunca mais poderei abrir o jornal de domingo e encontrar pérolas como "O futebol não aprimora os caracteres do homem, mas sim os revela", ou "Copiar o bom é melhor que inventar o ruim". Mas sei que seus ensinamentos permanecerão na memória de todos que apreciam o esporte-arte.

Vai com Deus, velho mestre. Vai fazer mágica aí, onde quer que você esteja. Só temos que lhe agradecer. Eternamente.

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